Revista de Direito da Cidade
vol.07, nº 03. ISSN
2317-7721
DOI:
10.12957/rdc.2015.18843
Trabalho enviado em 22 de junho de 2015.
Aceito em 26 de julho de 2015.
OS IMPACTOS SOCIAIS DA LÓGICA CRIMINALIZADORA NA
ESCOLARIZAÇÃO DAS CLASSES POPULARES
SOCIAL IMPACTS OF THE CRIMINALIZING LOGIC
AT THE EDUCATION OF POPULAR CLASSES
Rodrigo Torquato da
Silva
RESUMO
O objetivo do artigo é apresentar
os resultados de uma pesquisa de campo cuja proposta expõe uma reflexão crítica e analítica acerca
das interfaces existentes entre as lógicas e discursos oriundos da Criminologia,
e os seus rebatimentos nas práticas discursivas pedagógicas que se desenvolvem
nas escolas públicas que atendem, predominantemente, os estudantes das classes
populares. A hipótese fundamental é de que os tipos de justificativas presentes
nas narrativas pedagógicas que tentam explicar o fracasso escolar desses
estudantes apoiam-se, sobretudo, no uso de argumentos migrados do Campo jurídico-penal.
A pesquisa mostrou que o exercício da linguagem audiovisual, bem como a
operacionalização dos equipamentos disponíveis, possibilitou aos estudantes em
questão, supostamente avaliados com problemas de aprendizagem, demonstrarem
competência no uso desses instrumentos, utilizando, funcionalmente, o
raciocínio lógico e o pensamento conceitual. O artigo traz consigo uma relação
estreita com outros trabalhos realizados pelo Grupo de Pesquisa ALFAVELA-UFF/CNPq,
destinando-se a operadores do Direito e Educadores, ainda que não exclusivamente,
visto o entrelaçamento e impacto de tal assunto no cotidiano e nas nossas rotinas.
PALAVRAS-CHAVES: Direitos Sociais – Educação fundamental – Criminologia -
Tecnologias
ABSTRACT
The objective of this article is to present the
results of a research that exposes a critical and analytical reflection about
the interfaces between the logics and discourses originated from the
Criminology, and its repercussions in the teaching discursive practices on the
public schools serving students from the popular classes. The fundamental
hypothesis is that the justification present in the pedagogical narratives
attempting to explain the school failure of the students is supported by the
use of arguments from the legal and criminal fields. The research has shown
that the exercise of the audiovisual language, as well as the
operationalization of the available equipment, made it possible for the
students, supposedly evaluated with learning problems, to show competence in
the use of those instruments, exercising, functionally, logic thinking and
conceptual thinking. The article brings a close relationship with other works
conducted by the Research Group ALFAVELA-UFF/CNPq and is intended for the Law
operators and Educators, although not exclusively, due to the intertwining and
impact of such matters in our daily life and routine.
KEYWORDS: Social Rights – Fundamental Education
- Criminology - Technology
INTRODUÇÃO
Diante do que se
tem vivenciado, recentemente, em nossa sociedade – populações fazendo justiça com
as próprias mãos, amarrando ladrões em postes e espancando-o até a morte,
rebeliões em presídios com decapitações aos moldes da justiça medieval, proposta
de redução da maioridade penal sendo justificada por roubos de bicicleta, supostamente
realizados por crianças pobres, armadas com facas – justifica-se um estudo que
ouse estabelecer uma interlocução entre o campo da Criminologia e as pesquisas
que investigam o cotidiano escolar? Em que medida as questões levantadas no
campo da Criminologia podem ajudar a entender melhor o suposto fracasso escolar
dos estudantes das classes populares?
Estabelecendo uma reflexão acerca da lógica
criminalizadora e seus impactos sociais sobre o sistema educacional brasileiro,
pode-se trazer à tona elementos indispensáveis para uma análise crítica. Um
desses elementos fundamentais são os discursos que tipificam o crime,
qualificando os diversos comportamentos transgressores da norma (normalidade).
Resulta daí um importante ponto de observação que mostra
a omissão de alguns debates oriundos da Criminologia, em alguns processos de
análise pedagógica, no estabelecimento dos nexos de causalidades entre o
fracasso escolar e os estudantes das classes populares. Na maioria das vezes,
os discursos oficiais das escolas públicas (sejam os transcritos nos boletins
ou nos relatórios anuais de avaliação) não assumem, de forma aberta e
transparente, a questão da possível relação existente entre os discursos
criminalizadores e o fracasso escolar, muitas vezes porque existem “melindres”
que envolvem o medo das consequências possíveis para aqueles ou aquelas que
decidem expor os problemas.
Lógico está que as questões
levantadas pertencem a um conjunto de problemas sociais que não se esgotam
apenas nas reflexões de um artigo, dada, inclusive, as próprias limitações das
exigências relativas ao sistema de publicação acadêmico (limitação do número de
páginas, de caracteres etc). Em função disso, delimitou-se o presente trabalho
num recorte de uma pesquisa de campo, realizada numa escola municipal da Rede
de Ensino de Niterói que atende predominantemente a estudantes oriundos das
classes populares, e que serve, aqui, como base empírica para a análise.
O propósito
fundamental deste artigo é demonstrar como os discursos criminalizadores não
somente circulam no ambiente escolar, mas, sobretudo, reforçam os preconceitos
e estigmatizam os comportamentos dos estudantes das classes populares,
contribuindo para a subtração dos Direitos Sociais que são sustentáculos da
Constituição de 1988 e condição sine qua
non para a construção de um Estado Democrático de Direitos.
Cabe ressaltar que não se trata
apenas de trazer um rol de soluções
metodológicas aos graves problemas sociais e históricos enfrentados ao longo de
décadas pela educação pública brasileira. Nem tampouco ditar inexoravelmente
como deveriam ser descritas ou tratadas discursivamente as atitudes dos
estudantes que praticam atos típicos de delinquência nas escolas públicas ou
aqueles enquadrados nos índices do fracasso escolar.
A
ideia é apresentar um estudo crítico e analítico que vise o aprofundamento
nessa temática e que faça um esforço para romper com as obviedades dos discursos pedagógicos ou midiáticos no
tratamento do tema. Para tanto, fundamenta-se a interlocução proposta aqui
entre os campos da Educação e da Criminologia, acreditando-se que os
tipos de justificativas presentes nas narrativas pedagógicas que tentam
explicar o fracasso escolar desses estudantes apoiam-se, sobretudo, no uso de
argumentos migrados do Campo jurídico-penal.
A
pesquisa em que se baseia o presente estudo contou com o apoio da FAPERJ, pois foi contemplada no
Edital de Apoio à melhoria ao Ensino nas escolas públicas no Estado do Rio de
Janeiro. Seu objetivo inicial era
apresentar aos estudantes o universo do audiovisual e tentar aproximá-los não
somente de uma linguagem tecnológica, mas também do desenvolvimento de uma
perspectiva crítica. Os estudantes selecionados encontravam-se nas séries iniciais
do Ensino Fundamental e apresentavam, pelo menos, um dos três tipos de
problemas mais frequentes dentro de um quadro de dificuldades traçados pela
escola: a) comportamentos violentos; b) apatia ou c) dificuldades de apreensão
dos conteúdos ensinados.
Dessa forma, para uma melhor estrutura deste artigo, a análise foi desenvolvida a
partir de dois pilares. O primeiro, apresentando a exposição detalhada da
pesquisa de campo que, embora não tivesse num primeiro momento a
intencionalidade de desvelar fatos que dialogassem diretamente com a Criminologia,
visto ser o objetivo primeiro tratar de questões pedagógicas, o fluxo dos
acontecimentos durante o desenvolvimento da pesquisa, tais como conversa sobre
violência e crimes entre os alunos, indagações das professoras sobre práticas
sexuais precoces entre as meninas, agressões físicas, comentários nos
corredores sobre tráfico de drogas nas adjacências, tudo isso provocou uma
inquietude que direcionou o estudo para a questão da Criminologia. Já o segundo
pilar, opera dando suporte a uma reflexão crítica na qual são postos em diálogo
alguns conceitos centrais do campo da Criminologia e do Direito Penal, no
intuito de fundamentar a tese aqui sustentada.
Acredita-se que a contribuição do
presente estudo encontra-se no compromisso político de aprofundar a discussão acerca dos Direitos Sociais, Democracia e Políticas
Públicas, para que estejam a serviço da desconstrução dos discursos fatalistas
que acirram as injustiças sociais e criminalizam as classes populares não
somente no contexto em que se produz o fracasso escolar, como também nos
reflexos que extrapolam os muros da escola pública.
ACERCA DA METODOLOGIA DA PESQUISA
Concretamente, no
que tange à exposição da metodologia, a pesquisa tomou forma a partir do
atendimento a grupos focais, formados por estudantes ligados às séries iniciais
do Ensino Fundamental e se desenvolveu a partir de quatro planos de ação:
1° plano: Reflexões sobre a profundidade do problema e a
historicidade da questão das violências na/da escola, promovendo exibições de
filmes consagrados e referenciais relacionados ao que chamamos de
“alunos-problema”, de forma a problematizá-los;
2° plano: intervenção direta no processo de produção textual e
de uso social da escrita, promovendo a elaboração e produção de roteiros autobiográficos
produzidos pelos próprios educandos;
3° plano: ampliação da gama de recursos de processos de
significação e no universo cultural e tecnológico dos educandos, promovendo a
instrumentalização na linguagem audiovisual;
4° plano: debates e reflexões com os educandos para que eles
compreendam a importância do resgate das memórias e da valorização da história
de vida de cada um e utilizem os conhecimentos aprendidos para a produção dos
filmes a partir dos roteiros autobiográficos selecionados, exibindo-os de forma
paralela aos debates na culminância do projeto.
As metas
estabelecidas tiveram como foco o caráter
analítico-investigativo, objetivando construir estratégias de combate ao
suposto fracasso escolar e, ao mesmo tempo, acompanhar (para melhor
compreender, e, assim, denunciar), as consequências e os impactos da violência
no/do cotidiano escolar, que se fazem presentes nos processos de
ensino-aprendizagem de algumas escolas públicas. Para tanto, investimos em
quatro aspectos:
a) Na promoção,
no estudante, de um ímpeto de análise e crítica ao assistir uma produção
audiovisual e, ao mesmo tempo, estabelecimento, por parte dele, de conexões com
sua realidade;
b) Na
apropriação e construção de diversos textos escritos e gêneros literários a partir
dos roteiros, dando sentido ao uso social da língua;
c) Na ampliação
do leque de informações alternativas ou de domínio técnico para operar em
diferentes áreas da produção audiovisual, enriquecendo, desta forma, a
capacidade de expressão e comunicação dos estudantes.
d) Na
consolidação das ideias de que todo cidadão tem o direito de aprender a ler e
escrever na escola pública e, como consequência, pleno exercício da liberdade
de expressão.
Esperava-se com
isso que, ao findar de um ano, fosse possível não somente contribuir para que os
estudantes envolvidos apresentassem resultados significativos no que tange ao
domínio da leitura e da escrita, mas, sobretudo, após uma avaliação coletiva
envolvendo a escola e os professores integrantes do projeto, compreender melhor
os processos que desencadeavam algumas violências cotidianas na escola.
Assim, fica
claro que a escolha e o objetivo com a qual a metodologia estava comprometida (a
pesquisa de Campo, a análise documental e os grupos focais, incluindo, ainda, as
entrevistas-conversas informais) vinculava-se estritamente à ideia de coparticipação
e intervenção no cotidiano escolar, através de registros e filmagens com as
professoras e estudantes da referida escola pública.
BREVE RELATO DA EMPIRIA
A chegada na
escola do projeto de pesquisa "Imagem, Som e Alfabetização" se deu em
2011. Em uma reunião pedagógica ordinária, nos turnos da manhã e da tarde,
apresentamos aos professores, à equipe técnico-pedagógica e à Direção a síntese
desse projeto.
No início de 2012,
já contemplados pelo edital FAPERJ,
fizemos uma reunião para apresentar como se daria a operacionalidade do Projeto
e como dialogaríamos com a rotina da escola. A nossa proposta, de certa forma,
delineava-se cartesianamente em três movimentos: a) de um horário para estar
regularmente com os estudantes (algo em torno de 3 horas) em um dia na semana,
nos dois turnos; b) de uma sala que comportasse com qualidade os equipamentos,
os estudantes e nós (pesquisadores e bolsistas, que na soma éramos nove – o
coordenador, os dois bolsistas de treinamento e capacitação técnica –
professores da escola, os dois bolsistas de iniciação científica, as três
bolsistas "jovens talentos", vindas do Ensino Médio de uma escola
parceira, e um jornalista – que esteve todo tempo como voluntário); e c) da
parceria das professoras que apontariam 30 alunos (sendo 15 estudantes por
turno), que apresentassem três tipos de “problemas” com os quais a escola
admitisse não estar conseguindo lidar: 1- dificuldades de aprendizagem; 2- histórico
de violência na escola; e 3- apatia.
Nosso objetivo
inicial de trabalho com os estudantes era bem simples: exibir trechos de filmes
e problematizá-los a partir da trocação
de ideias.
Paralelamente à exibição dos filmes e após as conversas, conduzimos os
processos sugerindo que os estudantes manuseassem os equipamentos disponíveis
(câmeras, fones, microfones, tripés) e fossem se familiarizando com os
primeiros códigos da linguagem tecnológica do audiovisual, como
"focar/desfocar", "dar o zoom",
"dar o rec", segurar a
câmera e movimentá-la lentamente, montar e desmontar o tripé etc.
Foi possível
perceber que os filmes que não abordavam diretamente temas atrelados ao dia a
dia dos estudantes e que se passavam em contextos longe de suas realidades não eram
capazes de mantê-los concentrados e, por consequência, potencializar as
discussões em sala, por mais que provocássemos os debates. Por sua vez, os
filmes que traziam como cenários as favelas, escolas públicas e nuances das
tensões e dos códigos desses contextos (como, por exemplo, as disputas
territoriais entre facções) eram mais potentes nesse sentido, com uma
participação mais intensa dos estudantes que, com clareza e segurança,
demonstravam verbalmente conhecimentos acerca dos assuntos tratados.
Pode-se constatar que os recursos audiovisuais
favoreceram uma ampliação para outras expressividades possíveis, para além da
necessidade de uso das habilidades de decodificação da língua escrita.
Permitiram, com isso, chegar ao que poderíamos denominar de registros
imagéticos, ou seja, um conjunto de possibilidades imagético-discursivas das
experiências vividas nos cotidianos e nos contextos de inserção socioculturais,
bem como o registro-denúncia da dramaticidade existencial das crianças, por
elas mesmas.
Para melhor
exemplificar, serão apresentadas a seguir duas situações da empiria, vivenciadas
e registradas no Relatório de Pesquisa.
Situação – 1
Trabalhávamos
com a preparação do plano de filmagens no qual eram apresentados aos estudantes
três tipos de filmes-registros possíveis que eles poderiam fazer assim que fôssemos
para a rua realizar as filmagens externas:
1
- Ficção – Quando o autor inventa uma história ou roteiro da sua imaginação sem
necessariamente ter compromisso em mostrar a realidade, como por exemplo,
histórias de extraterrestres, etc;
2
- Documentário – No qual é possível realizar uma denúncia de um fato que esteja
ocorrendo, por exemplo, um esgoto na iminência de trazer doenças para a
comunidade;
3
– Biografia – Registro no qual a pessoa pode contar a sua própria história ou a
história de alguém a quem se dê importância.
O menino Tales, de aproximadamente
12 anos, estudante do 5º ano, que desde o primeiro encontro conosco mostrou-se
reticente a permanecer na sala, não só afirma rapidamente que o conjunto de
estudantes que ali se encontram “são os burros da escola”, como certifica que
ali não quer estar porque “não gosta de escola e não gosta de fazer dever”.
Percebemos logo que se tratava de
alguém que, embora selecionado pela escola para estar no projeto porque era
tido como um estudante com dificuldades de aprendizagens, de forma inteligente
e sagaz fez a análise de conjuntura e a leitura daquele contexto, e, de pronto,
nos encosta na parede e diz: E aí? O que é que vocês têm de diferente aí pra
mim? Tal provocação leva a uma indagação: quais são as matrizes que imprimem no
estudante o estigma de que ele tem problemas para aprender?
Propusemos a confecção de roteiros
que incluíssem também o registro de narrativas orais. Nesse momento, para nossa
surpresa, indo de encontro a tudo o que esperávamos, Tales disse que queria
filmar uma experiência própria, e passou a narrá-la:
- (Tales) Tio, eu quero filmar minha égua!
- (Pesquisador) Quer filmar o quê? Uma
régua?
- (Tales) Minha égua, tio! Éeeegua!...
A
surpresa do pesquisador que forçou Tales a repetir pausadamente o que queria
filmar mostra que mesmo cercados de todos os cuidados para não reproduzirmos
estigmas oriundos da lógica criminalizadora ou preconceituosa, admitimos,
esperávamos que ele sugerisse filmar, a bem da verdade, algo que permeasse o
contexto que está fortemente presente no nosso imaginário do que seja o
cotidiano desses estudantes: conflitos de facções, cenários de extrema pobreza,
dramas com mortes precoces etc. No entanto, Tales, o mesmo que não gostava de
escola e de fazer dever, propõe filmar sua égua e escolhe o caminho do bucólico. Será que ele
estava pensando em fazer poesia usando os recursos audiovisuais que estavam ali
disponíveis?
Ao analisarmos atentamente esse
acontecimento, por mais nobre que fosse a nossa intenção de oferecer aos
estudantes daquela escola uma possibilidade de registrarem suas experiências
cotidianas, a margem de manobra para o uso dos recursos audiovisuais já estava
traçada por nós, para eles. Estávamos,
ainda que com "boa intenção", induzindo-os nas criações possíveis dos
seus próprios registros de experiências cotidianas. Ou seja, os discursos que
naturalizam a violência como parte dos contextos sociais desses estudantes
também nos induzia à expectativa de uma vida estereotipada de crianças
faveladas que, necessariamente, seriam "completamente" marcadas por
opressão e violências cotidianas.
No fundo, já estava dado, para nós,
que as crianças, inclusive Tales, não nos surpreenderiam com nenhuma temática
que fugisse ao balizamento demarcado pela tríade violência-apatia-desesperança.
O ato criativo de buscar um tema bucólico, em um município distante, onde
morava um tio, e filmar a própria égua (impensável, para nós, uma criança de
favela ter uma égua!) é uma explosão no conjunto de possiblidades nas quais os
discursos da violência cotidiana e da lógica criminalizadora predominam.
Situação – 2
Participávamos
de uma reunião de avaliação em que estavam presentes os integrantes do projeto,
professores, diretora e Equipe Técnico-Pedagógica (ETP) da escola. Muitos foram
os assuntos abordados e pontos de reflexão sobre o projeto. Falou-se sobre uma
reunião na qual as professoras tiveram com os pais dos estudantes e que estes estavam
gostando do projeto, pois viam ali uma oportunidade de se revelarem grandes
talentos entre os estudantes, ao realizarem aquelas filmagens. Uma professora
revelou que uma das suas alunas estava melhorando depois do projeto, pois
estava mais atenta e fazia as tarefas com mais interesse. No entanto, houve um
ponto de tensão cujo tema é de abordagem extremamente delicada não somente para
a escola, mas para a sociedade em si, principalmente à luz do Direito Penal.
Foram
levantadas pelas professoras e também pela Equipe Técnico Pedagógica algumas
questões conflitantes que perpassavam o cotidiano da escola, relativo aos
estudantes que compunham o projeto, e que, geralmente, não eram expostas de
forma tão explícitas em reuniões oficiais. Queriam saber como estávamos lidando
com os constantes comentários que ouviam daqueles estudantes, já que elas eram
professoras deles e, portanto, sabiam que ocorriam.
Segundo
elas, era comum ouvirem dentro de sala de aula, por exemplo, conversas em que
as crianças expunham questões complexas das suas sociabilidades como, por
exemplo, uma suposta iniciação precoce na prática sexual, que, para as
professoras, eram ditas de forma exacerbada e que preocupavam visto que eram perigosas
para estudantes de tão tenra idade (crianças ainda). Atentaram para falas em
que os estudantes relatavam frequentarem bailes funk. Uma dessas crianças
expunha, inclusive, que tinha um “conhecimento técnico sobre armas” (de fato
ouvimos, certa vez, no projeto, um estudante conversando com outro, insinuando
que sabia montar e desmontar uma pistola). As professoras queriam saber se
também ouvíamos esses assuntos, ainda que de forma informal, quando os
estudantes conversavam entre si, sobre o cotidiano da favela. E se isso ocorria
mesmo nas favelas. Se havia algo de verdadeiro sobre isso.
Chegamos
a conclusão, depois de conversar com muitos melindres, de que não tínhamos
competência para aprofundar o debate e que era prematuro afirmar algo dessa
natureza, visto que ficava muito difícil levantar uma hipótese apenas pelas
narrativas, com um público ainda, em sua maioria, na fase infantil. Uma
pedagoga da escola, por fim, sugeriu que fosse então criado um espaço em sala
de aula, para que os alunos pudessem mostrar os seus trabalhos e registros
filmados. E falou também da importância de trabalharmos trocando informações e
dialogando sobre a pesquisa.
As duas situações descritas acima
possibilitam constatar que a escola é um espaço potente tanto para consolidar discursos criminalizadores
quanto para criar estratégias que os desconstruam. Nesse sentido, a
possibilidade de uso de equipamentos que tornou possível a expressão
audiovisual, permitiu aos estudantes, tachados profeticamente como meninos que não têm jeito, “ajeitarem-se”
desajeitando o modelo de escola que os profetiza como aqueles que têm problemas
de aprendizagem. Há, no domínio da técnica e dos conhecimentos acerca da operacionalização
dos equipamentos, uma possibilidade de demonstração factual de que os
“conteúdos” ensinados durante as “trocações” de ideias são mais significativos e
possibilitam retratar melhor a dura e complexa realidade em que os estudantes
vivem. Com isso, fica claro que os mesmos não têm problemas de aprendizagens de
“conteúdos complexos e/ou técnicos”, ao contrário, a sua capacidade de aprender
e de demonstrar o uso do conhecimento aprendido é convertido, diante de todos,
em ação-comprovação da expressão daquilo que querem filmar (“Quero filmar minha
égua!”). Essa demonstração, feita por cada estudante, do uso daquilo que
apreendeu, tanto na operacionalização dos equipamentos quanto no planejamento
das filmagens, desconstrói, portanto, a profecia da escola (“eles têm problemas
de aprendizagem”).
Fato importante, também, nesse processo é que todos podem
se ver (e demonstrar isso ali) aprendendo a lidar com os “conteúdos” complexos
e sistematizados de elaboração dos roteiros de vários tipos. Mesmo aqueles que
não dominavam plenamente a habilidade de decodificação do código linguístico
escrito (não eram alfabetizados a contento) aprenderam a elaborar roteiros em
modelos storyboard e
a organizar o planejamento das sequências de filmagens externas. Demonstraram
aí uma enorme capacidade criativa na construção das suas narrativas,
principalmente quando criaram seus próprios roteiros e planos de filmagens para
as suas histórias de vida.
A partir daí, o
alijamento que até ali predominou na relação com a escola passou a ser
tensionado pela possibilidade de denúncia que o recurso audiovisual lhes oferecia.
Suas culturas e “valores comunitários”, construídos nas relações necessárias de
solidariedade que o viver nas favelas impõe, puderam ser não somente elaborados
e exibidos na escola, mas ressignificados e compreendidos por ela. A origem
social dos estudantes bem como a dramaticidade das condições existenciais
podiam então ser vistas e contempladas pelas filmagens das crianças, e,
fundamentalmente, problematizadas e tematizadas como elemento curricular.
Isso permitiu
sugerir um currículo com tematizações contextualizadas, que envolvem temas
sobre as múltiplas infâncias encontradas na escola, no bairro, no país, por
exemplo. Compreende-se que as imagens registradas pelas próprias crianças nos
seus contextos podem ser tensionadas com as que predominam no cinema, nas
novelas e nos comerciais das infâncias propagadas como universais. O principal
objetivo neste caso seria fazer com que a escola e as crianças compreendessem,
indagassem e debatessem a complexidade da sociedade de classes em que estão
inseridas e que não naturalizassem de forma fatalista os “fenômenos” econômicos
e a crueldade social que as atingem diariamente.
Para que se
possa alcançar algum êxito na escolarização desses estudantes não se pode
descartar a sua condição existencial. Um estudante que passa a maior parte do
seu tempo interagindo com sociabilidades, linguagens, conceitos, nos espaços
onde mora, considerados, pela escola, de menor valor, está fadado não só ao
fracasso escolar, mas à estigmatização. Assim, fica claro que o que se tem é
uma injustiça tanto social quanto cognitiva, na medida em que se quer atribuir
ao estudante o seu fracasso escolar, sem levar em conta que a capacidade de
aprender conteúdos, conceitos, etc, está diretamente ligada à oportunidade de
estar inserido num meio que seja farto daquilo que é exigido pela escola. Exige-se que os estudantes pensem, compreendam
a partir de um tipo de racionalidade imposta pela escola, sem considerar as
ferramentas ou os instrumentos conceituais que eles trazem, que são frutos das
suas interações e experiências no meio onde habitam, e que envolvem discursos
de classes, ideologias, conceitos, conteúdos, formalidades e informalidades
para a execução de tarefas, além de violências cotidianas de
policiais/milícias/traficantes. Pior que isso, encontra-se uma clara
transferência de discursos criminalizadores bastante comuns no universo do
Direito Penal que surgem nos discursos pedagógicos usados como justificativas
do fracasso escolar. Essa é uma motivação que justifica uma pesquisa visando a
compreender melhor a relação entre a expansão da lógica criminalizadora do
Direito Penal e a escolarização das classes populares.
RELAÇÃO DA LÓGICA CRIMINALIZADORA COM O DIREITO PENAL
De acordo com
Vera Malaguti (BATISTA, 2012), é possível afirmar que todas as definições da
criminologia são atos discursivos.
Segundo a
referida autora:
[Os] atos de poder com efeitos concretos, não são
neutros: dos objetivos aos métodos, dos paradigmas às políticas criminais. [...]
A criminologia se relaciona com a luta pelo poder e pela necessidade de ordem.
A marcha do capital e a construção do grande Ocidente colonizador do mundo e
empreendedor da barbárie precisaram da operacionalização do poder punitivo para
assegurar uma densa necessidade de ordem. (BATISTA, 2012: 19)
Nesse sentido, é
possível estabelecer uma relação entre os discursos positivados no Direito
Penal e as atitudes criminalizadoras daqueles agentes públicos (sejam eles
policiais, juízes ou professoras) que têm o poder de rotular os comportamentos “inadequados” de
alguns sujeitos, em alguns contextos, tipificados na norma jurídica. Isso não
apenas expande os vetores que criam (e/ou reforçam) os preconceitos sociais e
estigmas criminalizados daqueles que não se enquadram na “ordem”, mas,
sobretudo, criam um campo de legitimação e naturalização para a circulação de
tais discursos-atitudes.
Isso permite pensar
se não seria plausível afirmar que a “fratura exposta” do “Estado Democrático”
não seria o próprio Direito Penal. É possível perceber, sem muito esforço, que
essa é a esfera jurídica na qual o Estado melhor consegue criar uma áurea
mistificadora das relações oriundas das desigualdades sociais e dos conflitos
de classes. Ou seja, o Estado capitalista, sob a égide do Direito Penal, transforma os elementos fundantes da
sociedade capitalista em discursos-normas transformando as contradições do próprio
sistema em algo fatalista, mágico, místico, dado pela natureza ontológica
humana.
Para isso, esse
Estado sustenta um tipo de narrativa cuja metodologia tenta criar uma ideia
falsa de linearidade histórica do Direito Penal, principalmente no que tange ao
Direito Penal brasileiro. Mesmo dentro dessa lógica linear de narrativa,
esconde, por exemplo, o fato de que o direito Penal, na sua origem europeia,
teve como principal propósito, atender aos interesses da burguesia e, portanto,
foi criado para ser um sistema de mediação política (e também pedagógica) para
lidar com os conflitos sociais tais como os oriundos da Revolução Francesa, por
exemplo.
O Brasil passou
por um processo, denominado por alguns estudiosos de Colonialidade do Poder e
do Saber
(MIGNOLO, 2005; QUIJANO, 2005), no qual foi marcado a ferro e fogo pela
colonização eurocêntrica. Hoje, no que tange à justiça criminal, há um forte
reflexo disso somado às recentes reformas neoliberais tanto no Direito Penal
quanto na Política Criminal.
Para o diálogo
que se pretende fazer entre o Direito Penal e a Educação Pública das classes
populares, fundamentalmente no que diz respeito à tese de fundo aqui defendida,
faz-se mister, à guisa de reflexão, discutir um pouco acerca do processo e a
lógica que levou à criação da Lei dos Crimes Hediondos, Lei 8.072/90.
Surge aí um
marco, o início de um processo que instaura não somente a manutenção de antigas
crenças, mas, sobretudo, a criação de novas crenças, tais como as de que a
expansão e o recrudescimento do Direito Penal traz progresso para a sociedade.
O resultado prático de tais ideias consubstancia-se nos infindáveis processos
penais que resultam no esgotamento do sistema carcerário que, de alguma forma,
traz à tona um paradoxo, visto que implode a premissa fundante do Direito Penal
que é a promessa da ressocialização do cidadão-infrator.
Uma consequência
disso foi a criação de um “contrassistema” penal, dentro das inúmeras e
superlotadas carceragens do país, que não apenas desafia o Direito Penal, mas,
fundamentalmente, o próprio Estado Brasileiro.
Também coloca em xeque a segurança e o conforto da burguesia brasileira,
que o criou e o mantém através dos seus aparelhos de pressão política e de
controle da opinião pública.
No que se refere
ao progresso esperado, promessa central do Estado Moderno em todos os campos –
educacional, social, econômico, político, jurídico, etc. – o Direito Penal não
contribuiu em nada que desse motivo de festejos para as classes populares,
quiçá para a sociedade brasileira. Longe disso, o que se vivencia no cotidiano
é um sistema de opressão forte para com os mais precarizados, os alijados do
próprio sistema capitalista. Isso reflete novamente o paradoxo sugerido acima:
o de que o sistema penal, à medida que se expande, caminha para sua
autodestruição, pois, enquanto eficácia sistêmica, não é autorrealizável. Dessa
forma, fica claro que o Direito Penal, como possibilidade de normatização
socializadora e justiça social, não é sinônimo de eficiência como fazem crer os
discursos conservadores. O que se tem, em vez de justiça social, é um controle
para a manutenção da ordem vigente, leia-se, manutenção do status quo.
De acordo com
Juarez Cirino:
A prisão é o aparelho disciplinar exaustivo da
sociedade capitalista, constituído para exercício do poder de punir mediante de
privação de liberdade, em que o tempo exprime a relação crime/punição: o tempo
é o critério geral e abstrato do valor da mercadoria na economia, assim como a
medida de retribuição equivalente do crime do Direito. Portanto, esse dispositivo
do poder disciplinar funciona como aparelho jurídico econômico, que cobra a
dívida do crime em tempo de liberdade suprimida, e como aparelho técnico
disciplinar, programado para realizar a transformação individual do condenado.
(SANTOS, 2010)
Como foi
exposto, o Direito Penal nasce como instrumento legal de limitação e controle
visando à manutenção dos privilégios e a permanência das prerrogativas do status quo. Por isso, não é contrário à sua natureza que
ele se transforme ou se transmute em direito bélico, focado na segurança
pública dos bens e das riquezas privadas. Em vez de Estado Democrático de
Direito, focado na educação-formação humana das gerações futuras, temos um
estado de garantias dos privilégios, logo, das desigualdades socioeconômicas e,
consequentemente, das injustiças sociais e cognitivas.
Direcionando
para a problematização e aprofundamento do tema, voltemos à Lei dos Crimes
Hediondos, Lei 8.072/90. Esta Lei, ou mesmo o sistema penal, não define
conceitualmente, principalmente no que diz respeito à adjetivação, o que são ou
como definiremos aqueles que cometem tais crimes. Alberto Silva Franco
discutindo a questão da reincidência assevera que
(...) No baú dos trastes penais, num canto de
entretecidas teias de aranha, o legislador de 90 descobriu o conceito já tão
dilapidado de reincidência específica e cuidou de reanimá-lo. Ao dar-lhe nova
vida, não se preocupou, contudo, em redefini-lo para efeito de alargar ou
restringir sua conhecida área de significado. (Apud. GRECO, 2012: 220)
Se a Lei não os
definem claramente, a cargo de quem ficam as construções discursivas que
adjetivam tais criminosos? Ao senso comum, denominando-os de bandidos porcos,
sanguinários, X-9, alemão? À mídia, qualificando-os de repugnantes, perversos,
desumanos, inimigos? Quanto a este último adjetivo, Zaffaroni provoca quando
sugere que
A essência do tratamento diferenciado que se atribui
ao inimigo consiste em que o direito lhe nega a sua condição de pessoa. Ele só
é considerado sob o aspecto de ente perigoso ou daninho. Por mais que a ideia
seja matizada, quando se propõe estabelecer a distinção entre cidadãos
(pessoas) e inimigos (não-pessoas), faz-se referência a seres humanos que são
privados de certos direitos individuais, motivo pelo qual deixaram de ser
considerados pessoas, e esta é a primeira incompatibilidade que a aceitação do hostis,
no direito, apresenta com relação ao princípio do Estado de direito.
(ZAFFARONI, 2013: 18)
Vemos uma fenda
aberta para a “liberdade” de criação de constructos discursivos,
aqueles verbetes que qualificam, requalificam e desqualificam os que praticam
crimes. Assim, não é a discursividade formal normativa do Direito Penal que tem
o poder total de criar e produzir os termos adjetivos daqueles que cometem
crimes hediondos, mas sim outros veículos ao seu modo. Está posta aí a ponte
que estabelece a ligação entre estilos de vida e modos comportamentais (estes
últimos não nascem do nada, mas do conjunto de possibilidade de socialização
disponibilizados nos espaços de interações em que estão inseridos) e os
estigmas criminalizadores atribuídos, por outrem, aos que praticam qualquer
desvio.
Cabe ressaltar,
porém, que a difusão dos estigmas e estereótipos é um movimento diferente da
adesão voluntária aos modelos que surgem e são propagados. A adesão e o uso de
adjetivos estigmatizadores são incorporados não somente aos discursos
predominantes e corriqueiros das classes populares, mas também passam a fazer
parte do vocabulário daqueles que os criaram. Esses discursos são difundidos
como verbetes universais de enquadramento adjetivo, e as classes que são atingidas
diretamente pelos malefícios e preconceitos muitas vezes aderem ao uso desses
adjetivos em função dessa capacidade que os meios de controles e de difusão têm
de transformar criações políticas em invenções mágicas, naturais, que surgem
sem autores e sem intencionalidade. Resultam daí movimentos de adesão
distintos: de um lado estão os que podem difundir e aderir, caso lhes interesse;
do outro, aqueles que só podem aderir, visto que estão submetidos ao
poder-controle das Leis e dos mecanismos.
Um exemplo
recente é o caso da professora universitária da PUC-RIO e também do reitor da
UNIRIO que se envolveram, por via das redes sociais, num caso típico de
estigmatização de um modelo-estilo supostamente característico das classes
populares. O caso foi o de um passageiro que aguardava seu voo num aeroporto,
vestido de forma espontânea, com bermuda e camiseta (numa temperatura de 40 graus, é bom que se diga), e que teve
sua foto publicada, pela referida professora, em sua rede de relações, em que a
mesma insinuava que um aeroporto não era lugar para aquele tipo de gente
(leia-se; portador daquele estigma, o de classe popular ou, como nas palavras
do reitor da UNIRIO, um estilo sem o “glamour” que os daquele meio supostamente
apresentam). Isso revela, claramente, como se dá, no cotidiano, a propagação
dos estigmas.
Retomando o
debate, o Direito Penal e a Reforma de 1990 definiu de forma turva como devem
ser as normas penais, ou os conceitos qualificadores, para os agentes que
praticam as ações enquadradas no Crimes Hediondos. Portanto, a definição dos
agentes tornou-se uma questão política e de luta (resistências) de classes.
A concepção
técnica dos legisladores, à época, para definir os elementos conceituais dos
Crimes Hediondos (tráfico, tortura) não incluiu o homicídio simples, por
exemplo. O homicídio é a pedra angular que fez nascer o Direito Penal. Não
poderia ser desconsiderado, ou mesmo esquecido, na primeira formulação de Lei
dos Crimes Hediondos de 1990.
Segundo Rogério
Greco:
De todas as infrações penais, o homicídio é aquele
que, efetivamente, desperta mais interesse. O homicídio reúne uma mistura de
sentimentos – ódio, rancor, inveja, paixão etc. – que o torna um crime
especial, diferentemente dos demais. Normalmente, quando não estamos diante de
criminosos profissionais, o homicida é autor do único crime do qual,
normalmente, se arrepende. (GRECO, 2012:
p.130)
Dessa
forma, pode-se sugerir que tal desconsideração com o homicídio demonstra o
quanto a elaboração, a expansão e a consolidação da nossa legislação está refém
das grandes empresas de mídia, dos seus apelos e da capacidade de impor
diretrizes normativas, legisladoras, fazendo pressão e conduzindo a opinião
pública a pressionar o juiz togado, quiçá o Júri Popular.
Ficou muito evidente (e quem vivenciou esse período deve
lembrar bem disso) que a expansão dos elementos que caracterizam os crimes
hediondos teve uma forte influência da empresa Rede Globo de televisão, visto
que concomitante ao período de elaboração e fixação da Lei 8.072/90, aconteceu
um crime que chocou a opinião pública, envolvendo a filha da escritora e
novelista, Glória Perez, a jovem Daniela Perez. É inegável a influência deste
episódio, que conseguiu transformar um crime passional, bárbaro, em crime
hediondo. Isso demonstra o quanto o nosso Direito Penal é subsidiário da
pressão e dos apelos midiáticos que com seus aparelhos ampliam exponencialmente
o tamanho do fato impondo a lógica do medo e do terror, sem dar margens para as
garantias de defesa e de direito de todos os Réus, condenados a priori.
IMPACTOS DA LÓGICA CRIMINALIZADORA
Pelo que foi
apresentado até aqui, é possível sugerir que as crianças das classes populares
já chegam na escola pública marcadas, a
priori, sob os estigmas de uma “marginalidade” (tanto no sentido de estarem
à margem da sociedade formal quanto no sentido de estarem também à margem da
sociedade legal). Estamos falando de crianças que, em sua maioria, são
moradoras de favelas e,
portanto, vistas por muitos professores/professoras e por agentes educacionais
(e isso é frequentemente constatado em nossas pesquisas), em função apenas de
seus comportamentos peraltas, ou até mesmo violentos, como criminosos em
potencial. Em alguns casos até mesmo como criminosos em miniaturas.
Diante de tais
constatações, vem a questão: quais os processos de sociabilidades incorporadas
que impactam o cotidiano escolar e que permitem originar e/ou reforçar esse
imaginário social, acerca das crianças-estudantes das classes populares? Outra
questão igualmente pertinente é: em que medida o Direito Penal teria alguma
relação com esse imaginário, propagado nos contextos escolares através dos discursos
de professores, professoras e outros agentes da escola, já que os discursos do
Direito Penal têm um contexto específico de difusão e de uso conceitual e
prático, que se dá predominantemente na esfera do Direito propriamente dito?
Relacionado a
isso, Ratto aponta que
Muito dessa lógica judiciária pode ser encontrada nos
livros de ocorrências, cujo próprio nome remete a uma associação imediata aos
corriqueiros boletins de ocorrência das delegacias de polícia. Tal qual foi
mostrado no conjunto das ocorrências citadas até aqui, seus registros são
geralmente estruturados em torno de três partes centrais, não necessariamente
naquela ordem. Apresentam os dados de identificação dos alunos(as), ou seja,
dos acusados(as); narram a situação ocorrida, essa espécie de crime cometido,
muitos vezes registrando os indícios ou provas que o atestariam (marcas físicas
das agressões, testemunhos, confissões, acareações, dentre outros); e
explicitam as consequências, uma espécie de veredito final com a decorrente
“pena”, seja na forma de tudo o que já foi feito para resolver o problema, como
parte das justificativas para as providências tomadas, ou como prova dos
esforços da escola para o encaminhamento de soluções, seja na forma de uma
ameaça do que futuramente será feito, em caso de reincidência, seja ainda na
forma da providência presente, isto é, da medida que a escola efetivamente
toma, diante da situação narrada. (RATTO, 2007:
91)
Essas crianças
já estão, ao nascer, inscritas subjetivamente como infratores, em função da
própria condição existencial já que, enquanto moradores de favelas, vivem em
terrenos sem documentação de propriedade, em espaços abandonados pelo poder
público, onde o “Estado de Direito” só chega com uso desmedido da força ainda
que sob o discurso de “pacificação”. Discurso este que perde totalmente a
credibilidade e reforça ainda mais a histórica desconfiança das classes
populares na ação do Estado infringente de Direitos: “Cadê o Amarildo?”
É bom ressaltar que
a definição conceitual de Estado de Direito é complexa e demanda uma longa
discussão política e filosófica, que extrapolaria os limites deste trabalho.
Porém, mesmo reconhecendo que o sentido predominante do conceito tem uma forte
marca da colonialidade eurocêntrica, apresenta-se uma concepção que, de certa
forma, é a mais plausível, no momento, para fundamentar o sentido aqui exposto.
Portanto, justifica-se a citação da concepção defendida por Danilo Zolo.
Nos países ocidentais, os direitos subjetivos podem
ser defendidos e promovidos não só dentro do ordenamento do Estado de Direito,
mas também fora do seu âmbito formalizado, com instrumentos políticos,
informáticos, culturais, educativos, econômicos. (...) Os direitos são (preciosíssimas)
próteses sociais que permitem reivindicar com maior possibilidade de sucesso, e
sem recorrer novamente ao uso da força, a satisfação de interesses e de
expectativas socialmente compartilhadas. Mesmo a limitação do poder arbitrário
e a proteção institucional dos direitos subjetivos – os dois serviços
específicos do estado de Direito – são o resultado histórico de “lutas pela
defesa de novas liberdades contra antigos poderes”: são a outra face do
conflito social, estão e caem com ele. (ZOLO, 2006, p. 93-94).
Outra questão
importante, diz respeito à sociabilidade dos estudantes. Constantemente são
postos na pauta dos conselhos de classes escolares problemas de ordem
comportamental que indicam o que se pode denominar de ambivalência existencial
(necessária à sobrevivência das classes populares), que se consubstancializa no
debate sobre convivência e/ou conivência com os bandidos, ou com um tipo de
sociabilidade violenta.
O fato de muitas
dessas crianças compartilharem um território, como o de muitas favelas que,
muitas vezes, estão submetidas ao controle de traficantes, milícias ou mesmo
policiais da UPP, cuja regra geral é o uso desmedido da força, não é tarefa
fácil ou simples. Requer o desenvolvimento de um tipo de
inteligência-malícia-astúcia (quem sabe uma “Inteligência bandida”)
que não cabe nos padrões cognitivos almejados pela escola. Há outras questões,
como a corrupção tantas vezes publicizada pela mídia jornalística, que
contribuem para uma vida de silêncios forçados aprendidos desde a idade mais
tenra (é o famoso ver, ouvir e calar). Isso é suficiente para a estigmatização
dessas crianças-estudantes? Ou seja, o fato de nascer em famílias pobres que
compram naturalmente mercadorias sem o devido registro ou legalização (ainda
que entre tais produtos esteja o pão de cada dia, comprado nas padarias dos
becos), que participam de um capitalismo informal porém de forte impacto na
cultura econômica do país (vide o turismo nas favela, hoje), reforça o
imaginário dos/das professoras que lidam diretamente com essas crianças nas
escolas públicas?
É possível
verificar, a partir da pesquisa inicial, que as políticas de ensino público do
Estado, que deveriam cumprir-se como um Direito, na verdade contribuem para o
processo de manutenção da desigualdade educacional. Assim, não se cumpre o
dever de ensinar, na escola, o que é o fundamento da existência institucional
dela mesma, como, por exemplo, ensinar a ler e a escrever. Ou seja, ainda no
século XXI a educação brasileira convive com graves problemas que a desafiam. A
aprendizagem das classes populares, por exemplo, é, entre muitos outros, um
desses problemas. Muitas foram (e são) as tentativas que visam a resolvê-lo.
Várias instâncias vêm, historicamente, comprometendo-se com essa temática.
Projetos e propostas educacionais, teóricas e pedagógicas têm ocupado os
debates nas universidades com o intuito de compreender melhor o que acontece
nos cotidianos das escolas públicas desse enorme e complexo país. A atual
realidade mostra também que vários elementos oriundos dos conflitos sociais e
das relações citadinas confluem para ampliar a complexidade dessa temática,
dentre as quais se destaca a violência urbana.
Claro está que
as classes populares, oriundas dos locais mais precarizados, principalmente no
que diz respeito aos instrumentos e dispositivos citadinos (de urbanidade e
socioculturais), são preteridas nas opções de quem deveria disponibilizar tais
recursos, o Estado, tal como é disponibilizado para os bairros de população
mais abastada. Os preteridos, diante da situação em que se encontram, constroem
estratégias de sobrevivências riquíssimas, mesmo estando submetidos a grupos
armados que impõem ordens de sociabilidades violentas. Quem sabe, a partir do
conhecimento dessas estratégias, seja possível construir uma educação pública
mais eficaz e, consequentemente, uma justiça social mais democrática. Nesse
sentido, cabe a proposição de Boaventura Santos:
Estou convencido de que, para a concretização do
projeto político-jurídico de refundação democrática da justiça, é necessário mudar
completamente o ensino e a formação de todos os operadores de direito:
funcionários, membros do ministério público, defensores públicos, juízes e
advogados. É necessário uma revolução. Em relação aos profissionais,
distingue-se entre a formação inicial e a formação permanente. Ao contrário do
que sempre se pensou, a formação permanente é hoje considerada mais importante.
Dou-vos um exemplo. Na Alemanha, não há nenhuma inovação legislativa sem que os
juízes sejam submetidos a cursos de formação para poderem aplicar a nova lei. O
pressupôs é que, se não houver uma formação específica, a lei obviamente não
será bem aplicada. Temos que formar os profissionais para a complexidade, para
os novos desafios, para os novos riscos. As novas gerações vão viver numa sociedade
que, como eu dizia, combina uma aspiração democrática muito forte com uma
consciência da desigualdade social bastante sólida. E, mais do que isso, uma
consciência complexa, feita de dupla aspiração de igualdade e de respeito da
diferença. (SANTOS, 2011: 82)
Reafirma-se aqui que a luta contra a estigmatização e
a criminalização dos estudantes das classes populares é uma luta política
contra-hegemônica. Luta contra os que causam a condenação dos seus “estilos” de
vida, dos seus comportamentos, fora dos padrões impostos – cabe lembrar que
tais comportamentos não “brotam” do vazio, mas da própria condição
circunstancial de existência, do meio societário que lhe está disponível. A
condenação dos conhecimentos que emergem da luta de classe calcada nas resistências
e nos contra-ataques das experiências cotidianas mostra-se nos corpos marcados
pelas cicatrizes de todos os tipos de injustiças da sociedade em que
vivem.
Para corroborar essa discussão, torna-se pertinente,
embora longa, a citação de Alessandro Baratta, de suma importância para a
fundamentação do debate aqui exposto,
que vai ao âmago da questão quando diz:
Enquanto a classe dominante está interessada na
contenção do desvio em limites que não prejudique a funcionalidade do sistema
econômico-social e os próprios interesses e, por consequência, na manutenção da
própria hegemonia no processo seletivo de definição e perseguição da
criminalidade, as classes subalternas, ao contrário, estão interessadas em uma
luta radical contra os comportamentos socialmente negativos, isto é, na
superação das condições próprias do sistema socioeconômico capitalista, as
quais a própria sociologia liberal não raramente tem reportado os fenômenos da
“criminalidade”. Elas estão interessadas, ao mesmo tempo, em um decidido
deslocamento da atual política criminal, em relação a importantes zonas de
nocividade social ainda amplamente deixadas imunes do processo de
criminalização e de efetiva penalização (pense-se na criminalidade econômica,
na poluição ambiental, na criminalidade política dos detentores do poder, na
máfia etc.), mas socialmente muito mais danosa, em muitos casos, do que o
desvio criminalizado e perseguido. Realmente, as classes subalternas são
aquelas selecionadas negativamente pelos mecanismos de criminalização. As estatísticas indicam que nos países de
capitalismo avançado, a grande maioria da população carcerária é de extração
proletária, em particular dos setores do subproletariado e, portanto, das zonas
sociais já socialmente marginalizadas como exército de reserva do sistema de
produção capitalista. Por outro lado, a mesma estatística mostra que mais de
80% dos delitos perseguidos nestes países são delitos contra a propriedade.
Estes delitos constituem reações individuais e não políticas às contradições
típicas do sistema de distribuição da riqueza e das gratificações sociais
próprias da sociedade capitalista: é natural que as classes mais desfavorecidas
desse sistema de distribuição estejam mais particularmente expostas a esta
forma de desvio. (BARATTA, 2011: 197-198)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ficou claro que, concomitante ao enriquecimento dos
recursos tecnológicos nas escolas públicas, é crucial, para que se alcance uma
sociedade mais justa e democrática, uma luta política. A disponibilização de
ferramentas tais como os recursos audiovisuais, possibilita uma autoafirmação
dos estudantes das classes populares, pois materializa a possibilidade de, como
cidadãos submetidos a diversas formas de opressão, tornarem-se capazes de denunciar
sua condição existencial, bem como a perversidade da lógica criminalizadora.
Com isso, em vez de criminosos em potenciais, outras
lógicas seriam criadas para que se revelasse a potência de artistas, poetas,
políticos ou simplesmente cidadãos de direitos, num Estado de Direito legítimo
e de fato. Para isso, ter-se-ia como possibilidade concreta o cumprimento de,
pelo menos, três dos princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – (Lei
n. 9.394, de 20-12-1996):
Art. 3°
I – igualdade
de condições para o acesso e permanência na escola;
II –
liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a
arte e o saber;
III –
pluralismos de ideias e de concepções pedagógicas;
O objetivo deste
trabalho foi analisar criticamente em que medida há rebatimentos e impactos dos
discursos criminalizadores, normativos do Direito Penal, nas escolas públicas
que atendem predominantemente estudantes oriundos das classes populares. A
ideia foi a de identificar e problematizar os indícios de criminalização dos
comportamentos e das sociabilidades expostas pelos estudantes de origem já
mencionada acima. Infelizmente, o tema tratado aqui não é fato novo. Batista,
há muito tempo, vem chamando a atenção para essa problemática. Segundo ele:
Quando alguém fala que o Brasil é “o país da
impunidade”, está generalizando indevidamente a histórica imunidade das classes
dominantes. Para a grande maioria dos brasileiros – do escravismo colonial ao
capitalismo selvagem contemporâneo – a punição é um fato cotidiano. Essa
punição se apresenta implacavelmente sempre que pobres, negros ou quaisquer
outros marginalizados vivem a conjuntura de serem acusados da prática de crimes
interindividuais (furtos, lesões corporais, homicídios, estupros, etc.). Porém
essa punição permeia principalmente o uso estrutural do sistema penal para
garantir a equação econômica. Os brasileiros pobres conhecem bem isso. Ou são
presos por vadiagem, ou arranjem rápido emprego e desfrutem do salario mínimo
(punidos ou mal pagos). Depois que já estão trabalhando, nada de greves
para discutir o salario, porque a polícia prende e arrebenta (punidos e
mal pagos). (BATISTA, 1990: 38-39)
Os resultados da
pesquisa (ainda que em caráter provisório) constatam que muito do que foi dito
acima, pelo professor Nilo Batista, há décadas atrás, permanece em atualmente,
como feridas que não cicatrizam. As conclusões apontam para uma forte
influência, ainda hoje, dos argumentos criminalizadores na composição das
justificativas pedagógicas, na escola pública, para o “fracasso” dos estudantes
das classes populares.
A fundamentação discursiva criminalizadora
difundida no cotidiano escolar, para a visível impotência na não resolução das
dificuldades pedagógicas, cria uma falsa realidade do que de fato tal
instituição realiza com relação ao que seria a sua função social. Ao se ancorarem
numa confusão argumentativa que torna turva a transparência das ações
pedagógicas, os discursos criminalizadores passam, então, a justificar as
impotências da escola pública em não saber lidar com a complexa diversidade das
culturas, das sociabilidades e dos conhecimentos que se forjam numa sociedade
marcada pela desigualdade social.
Além disso, constatou-se
que há uma prática de vincular os discursos que naturalizam as violências supostamente
oriundas de sociabilidades forjadas nos contextos das classes populares à
justificativa da escola de não explicar pedagogicamente o porquê dos seus
estudantes não aprenderem o que deveriam aprender. Discursos como “são violentos”,
“apáticos” ou “têm problemas de aprendizagem” formam uma tríade de possibilidades
explicativas obtusas (e porque não dizer perversas).
Isso, de certa
forma, coaduna com o que vem apontando a pesquisadora Vera Malaguti, no sentido
de que os discursos que predominam nas perspectivas de política criminal (como,
por exemplo, os argumentos que legitimam a ampliação do tempo de
internação-punição dos jovens infratores, ou aqueles que sustentam a
perspectiva da redução da maioridade penal) tendem a criar inimigos sob medida.
Segundo a
pesquisadora:
As questões políticas colocadas hoje na América Latina
são questões de política criminal, da politização da violência (...) A
violência naturalizada, as cátedras do medo, a confecção de inimigos sob medida
se liga às técnicas de obediência obrigatória que poderão funcionar contra as
multidões em desemprego. Para os novos impuros, o discurso e as políticas de
“lei e ordem”, a nova cruzada a justificar torturas e execuções de negros e
pobres. (BATISTA, 2003: 104)
Tal lógica criminalizadora do Campo do Direito
Penal se retroalimenta, constantemente, em diversos contextos, entre os quais, o
cotidiano escolar, – em reuniões de conselhos de classes ou nos momentos livres
da recreação etc. Com a difusão desses discursos como justificativas para os “fracassos
escolares” dos estudantes das classes populares que não aprendem o que deveriam
aprender, além das instituições de ensino público não assumirem de forma eficaz
o seu dever político e institucional com a “coisa pública”, não se comprometem
de fato com a mudança desse quadro.
Percebe-se que algumas
dessas instituições deixam subentendida uma concepção de que tais seres humanos
(os estudantes em questão) não carregam em si (ou, quem sabe, não herdaram do
Ser Supremo), um “ânimo” para crescer em conhecimentos complexos, científicos.
Com isso, justifica-se o fato (ou a profecia) de que já nascem sem o “Espírito
Científico”. Ou
seja, “não têm jeito!” Mais grave ainda é o fato de que essa lógica cria
discursos turvos e ambíguos que não apontam diretamente qual é a questão
nuclear do problema que impede a escola de realizar-se na sua função
institucional (o ensino público). E, com isso, não oferece uma resposta
plausível à sociedade, quanto a sua impotência. Ao contrário, deixa implícito a
ideia de que ninguém, e todos, ao mesmo tempo, têm e não têm “culpa” (ou
culpabilidade), a não ser, claro, “deus”, que não foi justo com os estudantes
das classes populares e não lhes concedeu a dádiva de um espírito científico matricial.
Logo, ao não se
submeterem aos ordenamentos que tentam ajudá-los a alcançarem a condição de
civilizado, a instituição escola muitas vezes os consolida como a casta dos sem
“espírito científico”. Dessa forma, o que resta para essas instituições é criar
estratégias discursivas criminalizadoras que a isentem de assumir a própria
impotência institucional, até que eles (os estudantes das classes populares)
passem dessa (...) para “a Melhor”(...).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES,
N. et alii. Pesquisar o cotidiano na lógica das redes cotidianas. Texto
disponível na homepage do GT
Currículo, http://www.cfch.ufrj/gtcurrículo/,1998.
BACHELARD,
G. A formação do espírito científico:
contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1996.
BAKHTIN,
M. Estética da criação verbal. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes,
2003.
BORDA, O.
F. e BRANDÃO, C. R. Investigacion
participativa. Montevidéu:
Ediciones de La Banda Oriental SRL – Instituto Del Hombre, 1987.
BARATTA, A. Criminologia Crítica e
Crítica do Direito Penal: introdução à sociologia do direito penal. 6 ed.
Rio de Janeiro: Editora Revan: Instituto Carioca de Criminologia, 2011.
BATISTA, V. M. Introdução crítica à criminologia brasileira. 2 ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2011.
BATISTA, N. Punidos e mal pagos: violência, justiça, segurança pública e direitos
humanos no Brasil hoje. Rio de Janeiro: Revan, 1990.
DOWDNEY,
L. Crianças do tráfico: um
estudo de caso de crianças em violência armada organizada no Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro: 7 Letras, 2003.
EDUCAÇÃO. Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e legislação complementar – Lei n.
9.394/96 . Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de
Luiz Roberto Curia, Lívia Céspede e Juliana Nicoletti -. São Paulo: Saraiva,
2013.
FANON, F. Pele negra e máscaras brancas.
Salvador: EDUFBA, 2008.
_________.
Os condenados da terra. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1979.
FOUCAULT,
M. Microfísica do poder. Rio
de Janeiro: Edições Graal, 1979.
_________. Vigiar
e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1987.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos
que se completam. 39 ed. São Paulo: Cortez, 2000.
_________. Alfabetização e
miséria. IN: Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos.
São Paulo: UNESP, 2000.
___________. A alfabetização
em televisão. IN: Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros
escritos. São Paulo: UNESP, 2000.
___________. Pedagogia da
Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
_________.
Pedagogia
do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GRECO, R. Curso de Direito Penal: parte especial. Volume II: introdução à
teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa. 9 ed. Niterói/ RJ:
Impetrus, 2012.
HARVEY, D. A produção capitalista do espaço.
São Paulo: Annablume, 2005.
MARX, K. O capital: edição resumida/ Resumo
dos três volumes por Julian Borchardt (Biblioteca de Ciências Sociais). 3 ed.
Rio de janeiro: ZAHAR, 1973.
MATURANA,
H. Emoções e linguagem na educação
e na política. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.
MIGNOLO,
W. D. A colonialidade de cabo a rabo: o
hemisfério ocidental no horizonte conceitual da modernidade. In: LANDER, E.
(org). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos
Aires: Consejo Latinoamericano de Ciências Sociales - CLACSO, 2005, pp.
71-103.
NASCIMENTO,
A. O
quilombismo – 2ª ed. – Brasília/ Rio de Janeiro: Fundação Palmares / OR
Editor Produtor Editor, 2002.
PORTO-GONÇALVES,
C. W. Globalizando: a construção do
sistema-mundo moderno-colonial. (Parte – I). In: A globalização da natureza
e a natureza da globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
QUIJANO,
A.. Colonialidade do poder,
eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org). A
colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: Consejo
Latinoamericano de Ciências Sociales - CLACSO, 2005, pp.227-278.
RATTO, A.
L. S. Livros de ocorrência:
(in)disciplina, normalização e subjetivação. São Paulo: Cortez, 2007.
RIBEIRO,
A. C. T. Cidade e capitalismo periférico:
em direção à experiência popular. Margem Esquerda, v. 12, p. 25-31,
2008.
RIBEIRO,
L. C. Q. e KAZTMAN, R. A
cidade contra a Escola? Segregação
urbana e desigualdades educacionais em grandes cidades da América Latina.
Rio de Janeiro: Letra Capital: FAPERJ; Montevidéu-Uruguai: IPPES, 2008.
SANTOS, B.
S. Para uma revolução democrática da
justiça. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2011.
SANTOS, J.
C. Direito
Penal – Parte Geral. 4.ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010.
SILVA, R.
T. Escola-Favela e Favela-Escola:
“esse menino não tem jeito!” Petrópolis RJ: De Petrus et Alii: 2012.
SILVA, M. C. Uma
história da formação do leitor no Brasil. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009.
THOMPSON,
E. P. A formação da classe operária
inglesa. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1987.
WACQUANT,
L. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. 3 ed. Rio de
Janeiro: Revan, 2003.
ZAFFARONI,
E. R. O inimigo no direito penal. 2
ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007.
ZOLO,
D. Teoria e crítica do Estado de Direito.
In. COSTA, P. & ZOLO, D. (org) O Estado de Direito: história, teoria,
crítica. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
NOTAS